Palavras sobre a liberdade
Palavras sobre liberdade encarceram em si os limites paradoxais da tinta sanguenta ou sangrenta. Contaram-me o que os PIDES faziam a malta, todas as torturas pela noite a dentro, todos os dias tornando-se intemporais num eterno e longo martírio. Fala-se e sabe-se pouco dos chibos, das risotas malvadas e cínicas, da denuncia em murmúrios que a pouco soam ao murmúrio do mar, do nosso mar.
Por cá, ficaram ainda, aqueles fulanos do “bota a baixo”, e sem querer fugir da verdade, riem e julgam sem primeiro nem depois, riem aos quilos baratos, comprados numa qualquer loja do chinês, e, como o barato sai caro, fica-se-lhes pela imaginação todas as atrocidades que cometeriam – “ai se eu pudesse, colocava a cabeça do gajo num pau e a mulher, que não se percebe como anda com um gajo daqueles… nem vos digo o que fazia…” e é isto…
Lembram-me um indivíduo que se dizia amigo do meu pai, o Pedras lá da urbanização, que, aquando a morte do meu pai se pôs a fazer graçolas, dizendo que a melhor parte da herança era a minha mãe e que ele próprio, o Pedras, ainda a havia de apanhar…
Bem… 25 de Abril o caralho!
Pouco depois do 25 de Abril de 1974, aconteceu o que já vinha a ser preparado há algum tempo, o país que era Portugal foi oferecido ao capitalismo liberal e selvagem próprio dos EUA e, por isso, hoje em dia nos regozijamos tanto com obras ficcionais como o “9/11 – massacre nas torres gémeas” ou “o ataque à maratona de Boston” (mas quem é que gosta de maratona afinal??)… calhou-nos não inclinar para o comunismo, oh Santa Sorte, oh frustração sem prescrição médica.
Hoje somos deles ao ser portugueses (como hoje devemos mais do que o PIB, acho que a frase faz sentido).
Eu cá, perco identidade… quanto mais longe de Portugal, menos português (logo menos “deles”) e também não acontece que, por mais tempo passar na Bélgica me torne mais belga, sou mais abjecto, objecto, dejecto social.
Isso do “cidadão do mundo, do universo…” soa mais a caminho para a Nova Ordem Mundial, a homogeneização de culturas, absorção de tradições, desertificação dos rios dos nossos clãs que nunca se calavam e só se calam agora, quando deixam de ser clãs e passam a ser cães vadios e esfaimados.
No fundo, penso que o Pedras foi um cabrão.
Já agora, um pensamento que me ocorreu, “o Zeca Afonso morreu na miséria..”, diz-se muito, mas seria preferível que tivesse morrido rico e abastado? Que os valores que cantava fossem abafados mais estrondosamente e que desse barulho impagável, surgissem novos barulhos, novos, frescos e incisivos?
25 de Abril sempre? Fodasse ou Foda-se!! Sempre? Sem nada a interromper este passo atroz que só é passo por se vislumbrar uma sombra trémula e irrequieta…25 de Abril nunca mais, fascismo sempre…
Mário Negrão
A Liberdade é a que cada um faz e respeita, muitos já se esqueceram de como era e estão a deixar de mão beijada a Liberdade entregue e a cederem dando lugar a serem escravos e oprimidos de novo, pela sua própria indolência.